sexta-feira, 20 de maio de 2011

Anarquismo ou Socialismo? (continuação)




I – O Método Dialético
"No mundo tudo está em movimento... Muda a vida, crescem as forças produtivas, desmoronam-se as velhas relações sociais..." Karl Marx

O marxismo não é apenas a teoria do socialismo, é uma concepção integral do mundo, um sistema filosófico do qual decorre, logicamente, o socialismo proletário de Marx. Esse sistema filosófico se chama materialismo dialético.

Por isso, expor o marxismo significa expor também o materialismo dialético.

Por que se chama esse sistema materialista dialético?

Porque seu método é dialético e sua teoria é materialista.

Que é método dialético?

Diz-se que a vida social se encontra em estado de incessante movimento e desenvolvimento. Está certo: não se pode considerar a vida como algo imutável e estático; ela nunca se detém num mesmo nível, acha-se em eterno movimento, em eterno processo de destruição e criação. Por isso sempre existe na vida o novo e o velho, o que cresce e o que morre, o revolucionário e o contra-revolucionário.

O método dialético ensina-nos que temos de considerar a vida precisamente tal como é na realidade. Vimos que a vida se encontra em incessante movimento; portanto, devemos examinar a vida em seu movimento e perguntar: para onde marcha a vida? Vimos que a vida apresenta um quadro de constante destruição e criação; portanto, nosso dever consiste em examinar a vida em sua destruição e criação e perguntar: o que é que se destrói e o que é que se cria na vida?

O que na vida nasce e dia a dia cresce, é invencível; deter seu movimento para a frente é impossível. Isto é, se, por exemplo, na vida, nasce o proletariado como classe e cresce a cada dia, por débil e pouco numeroso que seja hoje, há de vencer, não obstante, ao fim de contas. Por quê? Porque cresce, porque se fortalece e marcha para a frente. Ao contrário, o que na vida envelhece e caminha para a sepultura, há de sofrer inevitavelmente a derrota, embora hoje represente uma força gigantesca. Isto é, se, por exemplo, a burguesia perde paulatinamente terreno e retrocede dia a dia, por forte e numerosa que seja hoje, há de sofrer, não obstante, ao fim de contas, a derrota. Por quê? Porque, como classe, se decompõe, se debilita, envelhece e se converte em carga inútil na vida.

Disso deriva, precisamente, a conhecida tese dialética: tudo o que realmente existe, isto é, tudo o que cresce dia a dia, é racional: e tudo o que dia a dia se decompõe, é irracional, e, portanto, não evitará a derrota.

Por exemplo: na oitava década do século passado, entre os intelectuais revolucionários russos surgiu uma grande discussão. Sustentavam os populistas que a força principal capaz de encarregar-se da "emancipação da Rússia" era a pequena burguesia do campo e da cidade. Por quê? – perguntavam os marxistas. Porque – respondiam os populistas – a pequena burguesia do campo e da cidade constitui agora a maioria e, além disso, é pobre e vive na miséria.

Replicavam os marxistas: é certo que a pequena burguesia do campo e da cidade constitui hoje a maioria, e, realmente, é pobre; mas será essa a questão? A pequena burguesia há muito tempo é a maioria, porém até agora não manifestou, sem a ajuda do proletariado, nenhuma iniciativa na luta pela "liberdade". Por que? Porque a pequena burguesia, como classe, não cresce; pelo contrário: decompõe-se dia a dia e subdivide-se em burgueses e proletários. Por outro lado, naturalmente, tampouco a pobreza tem aqui uma importância decisiva: os "vagabundos" são mais pobres que a pequena burguesia, porém ninguém asseverará que possam encarregar-se da "libertação da Rússia''.

Como se vê, o problema não se cifra em saber que classe constitui hoje a maioria ou que classe é mais pobre, mas em saber que classe se fortalece e qual se desagrega.

E como o proletariado é a única classe que cresce e se fortalece sem cessar, que impulsiona a vida social e agrupa em torno de si todos os elementos revolucionários, nosso dever é, portanto, reconhecê-lo como força principal no movimento contemporâneo, formar em suas fileiras e fazer de suas aspirações progressistas nossas próprias aspirações.

Era assim que os marxistas respondiam.

Evidentemente, os marxistas consideravam a vida de um modo dialético, enquanto os populistas racionavam de um modo metafísico e concebiam a vida social como algo estático.

Eis aí como o método dialético considera o desenvolvimento da vida.

Mas há movimento e movimento. Houve movimento na vida social durante as "jornadas de dezembro", quando o proletariado, erguendo a cabeça, assaltou os depósitos de armas e empreendeu o ataque contra a reação. Mas, temos também de qualificar de movimento social o movimento dos anos anteriores, quando o proletariado, sob as condições do desenvolvimento "pacífico", se limitava a declarar uma ou outra greve e a criar pequenos sindicatos.

É evidente que o movimento apresenta formas diferentes.

Pois bem, o método dialético afirma que o movimento tem dupla forma: uma evolutiva e outra revolucionária.

O movimento é evolutivo, quando os elementos progressistas continuam espontaneamente seu trabalho diário e introduzem, na velha ordem de coisas, modificações pequenas, quantitativas.

O movimento é revolucionário, quando os elementos progressistas se unem, se compenetram de uma só idéia e se lançam contra o campo inimigo, para extirpar a velha ordem de coisas e introduzir na vida mudanças qualitativas, instaurar uma nova ordem de coisas.

A evolução prepara a revolução e cria o terreno para ela; e a revolução coroa a evolução e contribui para prosseguir a obra desta.

Processos semelhantes ocorrem também na vida da natureza. A história da ciência mostra que o método dialético é um método autenticamente científico: começando pela astronomia e terminando pela sociologia, em todas as partes se encontra a confirmação da idéia de que no mundo nada é eterno, tudo muda, tudo se desenvolve. Por conseguinte, tudo na natureza deve ser examinado do ponto de vista do movimento, do desenvolvimento. E isso significa que o espírito da dialética penetra em toda a ciência contemporânea.

E no que se refere às formas do movimento, no que se refere ao fato de que, de acordo com a dialética, as pequenas mudanças quantitativas, levam, no fim de contas, às grandes mudanças qualitativas, essa lei também vigora, com igual intensidade, na história natural. O "sistema periódico dos elementos", de Mendeléiev, evidencia claramente a grande importância que na história natural tem o aparecimento das mudanças qualitativas, que surgem das mudanças quantitativas. É testemunho disso, na biologia, a teoria do neolamarckismo, à qual o neodarwinismo cede lugar.

Não nos referimos a outros fatos, exaustivamente esclarecidos por F. Engels, em seu Anti-Dühring.

Tal é o conteúdo do método dialético.

Como consideram os anarquistas o método dialético?

É sabido de todos que o fundador do método dialético foi Hegel. Marx depurou e melhorou esse método. Naturalmente, essa circunstância é também conhecida pelos anarquistas. Sabem eles que Hegel era conservador, e eis que, aproveitando a ocasião, atacam Hegel a mais não poder como partidário da "restauração", "demonstram" com paixão que "Hegel é o filósofo da restauração..., que ele exalta o constitucionalismo burocrático em sua forma absoluta, que a idéia geral de sua filosofia da História está subordinada e serve à tendência filosófica da época da restauração", etc.

"Demonstra" a mesma coisa em suas obras o conhecido anarquista Kropotkin (vide, por exemplo, sua Ciência e Anarquismo, em língua russa).

Com Kropotkin fazem coro em uníssono nossos kropotkinianos, começando por Tcherkezichvili até chegar a Ch. G. (vide os números de No bati).

Isto é certo, ninguém os contesta; pelo contrário: todo o mundo está de acordo em que Hegel não era revolucionário. Marx e Engels, pessoalmente, foram os primeiros a demonstrar em sua Crítica da Crítica Crítica que as concepções históricas de Hegel se acham em contradição radical com o poder soberano do povo. Mas, apesar disso, os anarquistas procuram "demonstrar" e consideram necessário "demonstrar" dia após dia que Hegel é um partidário da "restauração". Por que o fazem? Provavelmente para com isso tudo desacreditar Hegel e dar a entender ao leitor que o método do "reacionário" Hegel também não pode deixar de ser "detestável" e anticientífico.

Pensam os anarquistas que desse modo podem refutar o método dialético.

Afirmamos nós que desse modo apenas demonstrarão sua própria ignorância. Pascal e Leibnitz não eram revolucionários, mas o método matemático descoberto por eles é reconhecido, hoje, como um método científico. Mayer e Helmholtz não eram revolucionários, mas suas descobertas no domínio da física serviram de base à ciência. Tampouco eram revolucionários Lamarck e Darwin, mas seu método evolucionista pôs de pé a ciência biológica... Por que, então, não se pode reconhecer o fato de que, apesar do conservantismo de Hegel, o mesmo Hegel conseguiu elaborar um método científico, denominado dialético?

Não; desse modo os anarquistas apenas demonstrarão sua própria ignorância.

Prossigamos. Segundo a opinião dos anarquistas "a dialética é metafísica", e como "querem emancipar a ciência da metafísica e a filosofia da teologia", por isso, precisamente, repelem o método dialético (vide Nobati, nº. 3 e 9, Ch. G.; vide, também, Ciência e Anarquismo, de Kropotkin).

Ah! esses anarquistas! É como diz o ditado: "paga o justo pelo pecador." A dialética alcançou sua maturidade na luta contra a metafísica e nessa luta conquistou a glória; na opinião dos anarquistas, porém, eis que a dialética é metafísica!

A dialética afirma que no mundo nada é eterno, no mundo tudo é transitório e mutável: muda a natureza, muda a sociedade, mudam os usos e costumes, mudam os conceitos de justiça, muda a própria verdade; por isso mesmo a dialética considera tudo de um modo crítico, por isso mesmo nega a verdade estabelecida de uma vez para sempre e, por conseguinte, nega também as abstratas "teses dogmáticas fixas que, uma vez encontradas, têm apenas de ser decoradas'' (vide F. Engels, Ludwig Feuerbach).

Em troca, a metafísica nos afirma coisa completamente diversa. Para ela o mundo é algo de eterno e imutável (vide F. Engels, Anti-Dühring), o mundo está determinado de uma vez para sempre por alguém ou por algo; eis por que os metafísicos têm sempre na boca a "justiça eterna" e a "verdade imutável".


Fonte:marxists.org

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